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sexta-feira, 7 de março de 2008

Avaliação, a importância de um modelo

A Educação é campo fértil para as mais diversas controvérsias. O olhar dialético, presente sobre os variados temas, possibilita o surgimento de opiniões divergentes. Este fato é salutar. Contudo, as muitas teorias que surgem dificilmente ganham contornos práticos no cotidiano das escolas. A avaliação, notadamente, pertence ao grupo dos tópicos mais discutidos, estudados e também mais mal compreendidos na ação pedagógica.


Quando a perspectiva sociointeracionista propõe uma nova relação entre o professor, o aluno e o conhecimento, ela o faz partindo do princípio que o aprendiz não é um simples acumulador de informações, ou seja, um mero receptor. Ele é entendido como sendo protagonista na construção do conhecimento. Tal visão, portanto, exige um olhar avaliativo diferenciado, contributivo com o processo ensino-aprendizagem, e não mais com a função de mero classificador de desempenhos bons e ruins, alunos capazes e incapazes.


Essas assertivas parecem ter se tornado consenso no discurso de todos os educadores. Entretanto, o que se tem constatado na prática é que muita coisa não mudou no trato com a avaliação nas escolas. Ela continua servindo muito mais para classificar do que para estar servindo à construção da aprendizagem. Não há nada de errado com o discurso, o único problema é que ele não é coerente com a ação.A Realidade AtualUm olhar, mesmo que apenas superficial, sobre a prática avaliativa nas escolas públicas poderá constatar a quase completa ausência de parâmetros.


Cada professor acaba avaliando com critérios próprios, quando quer e da forma que deseja. Não há rumos coletivos claros, que nasçam de um projeto comum. Os educandos não sabem os meios pelos quais estão sendo avaliados, sendo privados de um norteamento claro para os seus estudos.Essas afirmações certamente encontrarão alguns questionamentos imediatos: O que se está sugerindo? Que se volte aos modelos tradicionais? Que se uniformize tudo? Que voltemos às velhas semanas de prova? Afinal, retroagiremos no tempo e abriremos mão das nossas conquistas?


Não. Não é nada disso que se sugere. Na verdade, muitos problemas nascem do fato de que justamente é aos extremos que muitos recorrem quando se fala na avaliação. Para alguns, o melhor é “amarrar” tudo dentro de um modelo rigoroso, que não dê vazão às inovações. Para outros, é melhor abolir qualquer “padronização” e permitir que tudo dependa do compromisso e capacidade dos educadores.Avaliação no CPM Alfredo ViannaA experiência vivenciada no Colégio da Polícia Militar talvez possa enriquecer o debate e contribuir para uma mudança no quadro atual.


Essa escola foi implantada em Juazeiro, no ano de 2006, trazendo modelos de gestão e atuação próprios, oriundos de unidades de outras cidades da Bahia.No que se refere à avaliação, o modelo trazido era realmente muito característico dos padrões tradicionais antigos. Estabelecia-se duas semanas de avaliação por bimestre, responsáveis por distribuir 7,0 dos dez pontos possíveis. Avaliar, assim, era uma tarefa estanque, com momentos pré-definidos e sem nenhuma possibilidade de adoção de estratégias diferenciadas.


Algo que não dava vazão ao apregoado na LDB 9.394/96, que discorre sobre a avaliação como sendo:“... contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais.”O modelo recebido causava entraves sérios, inclusive para a promoção das recuperações paralelas como mencionadas na própria legislação:


“Obrigatoriedade de estudos de recuperação, de preferência paralelos ao período letivo, para os casos de baixo rendimento escolar...”Os educadores do CPM perceberam os problemas inerentes ao padrão adotado. Existia também insatisfação por parte de muitos alunos. Partiu-se então, para a busca de mudanças que viabilizassem avanços no modelo adotado na escola. O que se pretendia era assumir a ação avaliativa como sendo voltada para a tarefa de subsidiar o olhar do professor.


Avaliar, entendeu-se, deveria servir para constatar, pelo menos aproximadamente, em qual estágio de desenvolvimento o educando se encontrava, entender por quais meios ele aprende e evolui mais satisfatoriamente, além de indicara necessidade mudanças no planejamento inicial. A avaliação deveria, segundo o entendimento dos educadores, evidenciar que possivelmente o diagnóstico e o plano inicial estivessem corretos ou que precisassem de revisões ou ajustes.Essas idéias, porém, não se adequavam ao modelo existente.


Mas há de se ressaltar um outro aspecto importante: a comunidade escolar não desejava abrir mão da existência de um modelo. Ter regras claras era um facilitador para a organização da escola, um ato de justiça e transparência para com um aluno e um meio de garantir rumos pedagógicos para os professores.A alternativa encontrada foi a de construir um modelo próprio, afeito a realidade da Unidade de Ensino.


O momento era então o mais propício, uma vez que a escola passava pela revisão do seu Projeto Pedagógico. Após uma série de debates, chegou-se aos atuais parâmetros avaliativos adotados pelo CPM e que, além de respeitado, é acreditado por todos, uma vez que surgiu de um processo democrático de discussões.Hoje a escola continua adotando normas, regras e datas, mas elas servem para melhorar e não para criar entraves. Dos 10 pontos possíveis, 5 ficam a cargo de instrumentos definidos pelo professor.


O educador, porém, deve fazê-lo em no mínimo 2 e no máximo 3 atividades durante o bimestre. De certa forma, o que se pretendeu foi tornar o ato avaliativo presente em todo decorrer das unidades letivas e colocá-lo à serviço da aprendizagem.As notas continuam sendo utilizadas. O sistema de ensino assim o exige. Entretanto, elas não constituem a avaliação, sendo apenas indicadoras dela. O olha do professor sobre o processo, o educando, a sua ação e a nota são o que chamamos de avaliação.


Com o fortalecimento do Conselho de Classe, essa nova concepção ganha contornos sistêmicos e não mais isolados, ou seja, dependentes da visão individual do professor.Recuperações ParalelasNo novo modelo, o educador pode incluir as ações de recuperação paralela. Um exemplo: quando o professor de Português diagnosticar que o rendimento da classe não foi satisfatório, ele tem toda liberdade para refazer sua avaliação depois de utilizar novas estratégias de ensino dos conteúdos.


Há no mundo educacional contemporâneo muita confusão em torno da recuperação paralela, tanto por parte de diversas escolas, quanto de muitos educadores. Ela não é claramente entendida por todos, não há parâmetros definidos, nem um projeto abraçado pela equipe.


Recuperar no processo não deve ser compreendido como uma “ajuda humanitária” ao aluno, mas como uma intervenção, cuja perspectiva pedagógica que a impulsiona concebe os diferentes ritmos e as diferentes necessidades de cada educando, ou seja, reformulando formas de ensino e métodos de trabalho para que se possam adequar à zona de desenvolvimento do aprendiz, pelo fato de que não se pode negar que nem todos aprendem da mesma forma ou pelos mesmos meios.


Em muitos lugares, a recuperação acontece como uma “prova depois da prova” que ocorre quase sempre após o término da unidade. Não se respeita a expressão “paralela”. No modelo construído pelo CPM, buscou-se viabilizar que a recuperação da aprendizagem ocorra ainda dentro das unidades, a partir do acompanhamento do professor.O Desenrolar do Processo AvaliativoFalamos sobre os cinco pontos distribuídos através de diferentes meios de avaliação. E quanto aos outros, não citados anteriormente?


Quatro deles continuam sendo destinados a uma avaliação escrita, realizada no final da unidade e aplicada numa semana marcada pela Coordenação Pedagógica. Isso pode ser entendido então como um “resquício” do modelo anterior? Pode, desde que a chamada “prova” não seja percebida como um instrumento avaliativo válido.Teóricos como Vasco Moretto têm defendido a validade da prova. Para ele, o teste escrito é um instrumento pertinente, desde que seja ressignificado. Aqui entra a importante atuação dos coordenadores.


Cabe a esses profissionais promover um trabalho de formação em serviço que permita aos professores dar uma nova lógica ao trabalho escrito. As Atividades Complementares podem e devem ser o espaço estudos e trocas de experiências entre os educadores sobre as suas práticas, inclusive as avaliativas.A prova é realmente útil à construção da aprendizagem, desde que seja elaborada para avaliar competências e habilidades trabalhadas no decorrer das aulas. Para tanto, ela deve obedecer a uma visão holística dos conteúdos, contextualizada a partir de situações-problemas adequadas aos estágios dos educandos.


Pensadores como Antoni Zabala (A Prática Educativa, Ed. Artmed) tratam da diversidade dos conteúdos a serem trabalhados na escola (conceituais, factuais, procedimentais e atitudinais), evocando a necessidade de uma nova postura avaliativa que contemple tal multiformidade. Para isso, os instrumentos a serem utilizados também devem ser coerentes com a tipologia dos conteúdos. A prova pode ganhar nova roupagem e funcionalidade seguindo neste sentido.ConcluindoEste artigo não tem a pretensão de fazer dos modelos de avaliação a solução para todos os problemas educacionais.


A intenção real é a de subsidiar uma discussão sobre o que a ausência de modelos traz como conseqüências para as escolas.Na experiência vivenciada no CPM (síntese do modelo em anexo), os resultados obtidos têm sido satisfatórios. A opinião dos estudantes aponta o fato de que hoje eles estão mais interessados na própria aprendizagem. Atestam que todos os momentos das aulas ganharam mais importância e não somente aqueles que, como costumam dizer, “vão cair na prova”.


A avaliação está o tempo todo presente, mas a aprendizagem também, inclusive durante os testes.O trabalho da coordenação pedagógica, da direção e dos professores não sofre com a ausência de coerência e sintonia nos trabalhos. A escola acaba se organizando em torno do modelo que adota, pois, se não há modelos, dificilmente haverá organização. Todos têm clareza sobre o que deve, como deve e quando deve ser feito. Esses ganhos, por si mesmos, já são demonstram como o assunto merece ser discutido.


Cada escola pode construir a sua estrutura avaliativa própria, dentro da sua realidade, levando em consideração suas limitações e potencialidades. O primeiro passo a ser dado refere-se, portanto, ao interesse de abraçar um projeto comum, que guie a escola e seja defendido por todos que a compõem.

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